Tratando de Aumento Salarial em uma Gestão Horizontal
Como tratamos de aumento salarial aqui no Ateliê de Software?
Este é um assunto relevante em qualquer empresa, pois salário, mais do que remuneração, reflete no reconhecimento sobre o trabalho. Em um modelo de gestão horizontal e distribuído, percebemos um panorama especialmente desafiador, sempre cercado por debates e discussões.
Adotamos o termo gestão horizontal para definir nossas práticas de gerenciamento, pois não nos orientamos em hierarquias. Ou seja, uma decisão de aumento salarial não vem de um gestor, pois não há gestores!
A principal dificuldade nesse contexto é que não há uma figura objetiva para pedir um aumento, e conversar com o grupo por vezes gerava algum nível de constrangimento. É comum o assunto ser visto pelas pessoas como tabu. Em razão dessas dificuldades cotidianas, buscamos alternativas que pudessem nos ajudar.
O primeiro passo foi combinar a frequência com que o tema seria abordado, além da definição de uma "fórmula" para que as pessoas pudessem saber o valor do dinheiro disponível, criando então alguns indicadores. Essa fórmula nos ajudou a manter a sustentabilidade da empresa, dando visibilidade à disponibilidade financeira, e apreciação sobre possibilidade de aumento para os interessados. Contudo, sempre parar toda a empresa para apreciar salários e discutir os indicadores não estava mais se mostrando algo viável.
Neste contexto, utilizamos da ajuda de uma valiosa ferramenta: Percival (“PERCeIved VALue”), desenvolvido por Klaus Wuestefeld . O Percival tem como finalidade gerar uma mensuração mais simples e mais justa sobre a apreciação de nossa contribuição.
Sabemos que algumas empresas utilizam esses resultados de forma direta na definição de salários. Em nosso contexto, porém, preferimos usar esses dados de forma auxiliar, sendo uma das variáveis implicadas nas decisões sobre aumentos.
A apreciação dos resultados do Percival se dá em dois momentos distintos: o primeiro momento é para definir quais pessoas teriam prioridade em obter um aumento salarial. Esta informação é uma mensuração individualizada, que consiste na combinação do resultado do Percival, do salário atual da pessoa e da quantidade de dias em que ela está sem receber aumento. Já o segundo momento consiste efetivamente na decisão sobre o aumento salarial: se haverá, e de quanto será . Como os resultados do Percival já representam uma percepção do grupo, entendemos que no momento de decisão sobre aumento salarial já não é mais necessária a participação de todos da empresa. A apreciação sobre um pedido de aumento é feita por um grupo pequeno e voluntário (em uma dinâmica que batizamos de WillRaise), onde apresentam seus pontos de vista e apontam juízos importantes para que possam chegar a uma síntese e consequente decisão. Toda colocação é bem vinda, inclusive questionar o próprio resultado do Percival.
Sobre o funcionamento do Percival: sua utilização é simples e eficaz. Todas as pessoas da empresa acessam a ferramenta através de seu e-mail corporativo, onde estão dispostos os nomes de todos os colegas em uma planilha composta por linhas. Cada participante poderá elencar o nome do colega para cima ou para baixo, de acordo com sua apreciação sobre sua contribuição na empresa. Em paralelo, é pedido ao participante que indique o grau de certeza para sua apreciação acerca de cada pessoa. Um baixo grau de certeza, por exemplo, indica que você não tem conhecimento suficiente para fazer uma apreciação precisa sobre a contribuição daquele colega, o que é considerado no resultado da ferramenta. Depois de executadas as apreciações, são gerados gráficos que exibem, segundo a visão do grupo, o quanto cada pessoa contribui para a empresa, e o quanto essa pessoa conhece e é conhecida pelos seus pares (o que é chamado de notoriedade).
Com esta ferramenta, agora podemos saber com maior precisão quem teria prioridade em receber um aumento salarial, sempre de acordo com o tempo em que a pessoa está sem receber aumento e com sua contribuição na empresa.
Lembrando que, com o resultado do Percival, ainda tomamos a decisão sobre o aumento salarial em relação a outros indicadores, apreciada na dinâmica citada anteriormente (WillRaise). Consiste em criar uma fila de prioridades, com ajuda do Percival, e alguns tópicos que podem ser abordados durante a dinâmica. São elas:
- Resultado do Percival;
- Depoimento de um membro do time da pessoa;
- Consulta ao P.O do projeto em que ela atua;
- Escuta da pessoa candidata ao aumento;
- Verificação se há recursos financeiros para o aumento.
Um dos problemas que encontramos é que as pessoas recém contratadas, normalmente, ficam com um nível de contribuição mais baixa, o que pode se justificar por sua recente integração. Por mais que este fenômeno possa ser compreendido, isso pode gerar um real desconforto.
Outra dificuldade está na crença de que pessoas com perfil mais introvertido não são notadas, e que isso impactaria na avaliação, ainda que seja mensurado o grau de certeza ao apreciar um colega. Temos incentivado a troca de pares entre times para ajudar o grupo a se conhecer (o que, além de tudo, promove uma troca de conhecimento sensacional). Temos percebido também que, independentemente destes receios, pessoas tímidas e comprometidas vêm sendo sim bem reconhecidas.
O uso do Percival com este mini-processo tem nos ajudado a abordar o tema Aumento Salarial com maior eficácia em nosso modelo de gestão distribuída. Contudo, o tema permanece sensível, e sempre revisitamos nossos métodos em debates e discussões. Obviamente, problemas novos surgirão e, como somos iterativos e incrementais, sempre estaremos em busca de respostas.
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